segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Primeira convicção

Quando pequeno, eu era uma criatura muito magrinha, as roupas em mim sempre caindo como um saco de batatas. Quem me via na rua sentia pena, imaginando as inúmeras privações a que me submetia. Por isso, não raro eu ganhava das pessoas presentes, tais como: sapatos usados, meias que ninguém mais queria, roupas rasgadas mas que podiam ser reparadas com um ponto de costura aqui, outro acolá. Vovó era especialista em reparar  as coisas velhas que eu levava para csa. Mamãe, no entanto, não gostava da ideia que faziam de seu menino: eu não era nenhum perdido, tinha casa onde morar, cama onde dormir e mãe que me amava. Ninguém nunca duvidou disso, afinal, todos me conheciam no bairro, mas mamãe era sempre do contra.

Apesar de magrinho, eu tinha uma cabeçorra enorme. As pessoas sempre se admiravm do modo como eu conseguia equilibrá-la sobre meu pecoço fininho. Alguns até aguardavam o momento em que eu não a suportaria mais e deixariaela tombar de lado. Faziam apostas.

Na rua, a primeira coisa que se vistava era meu cabeção despontando no horizonte como uma lua cheia. Então todo mundo ria. Devo admitir que, na época, aquilo me deixava ofendido. Hoje, no entanto, reconheço que não havia como minha aproximação provocar outra reação nas pessoas.


Além das roupas e dos sapatos que nunca me cabiam, também não havia chapéu que cobrisse minha cabeça. Aí eu realmente ficava pê da vida, porque gostava mesmo de chapéus. Queria me  parecer com  o Airton, mas meu cabeção não permitia.

Certo dia perguntei para mamãe por que tinha nascido daquele jeito. Não compreendia a razão de as demais crianças serem normais, enquanto que eu tinha aquela bola de basquete em cima do pescoço. Ela nunca me respondia, não do modo como eu queria. Em invés disso, dizia que "se as coisas estavam tortas, então era assim mesmo que Deus queria que ficassem". Foi a partir desse momento que surgiu minha primeira convicção: "Deus era um cara muito mau".

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