sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Tempo turbo,
turbulento,
atropelado
no cruzamento

- tudo ao mesmo tempo,
nada a contento -

Tempo
que não admite atrasos,
âncora dos afogados,
veias em via de congestionamento.

Tempo calvário
Tempo obituário
Tempo vendido
em novo (?) monstruário.
Tempo mentido revolucionário
embalado em redes cibernéticas,
patéticas realidades paralelas,
pseudo-mundo globalizado.
Tanta gente conhece tudo...
Tanta gente ignora
quem está perto!


quinta-feira, 27 de dezembro de 2012



Quando escrevo poesia, penso primeiro numa frase qualquer. Já tentei arquitetar uma poesia inteira na cabeça, mas nunca deu certo. A primeira coisa que me vem à cabeça é uma frase, ou pedaço de frase qualquer, cuja autoria sempre desconfio não ser original; penso já ter ouvido ou lido-a  em algum outro lugar - o que nunca me impede de escrevê-la. O corpo da poesia então vem surgindo, mais relacionada ao som do que ao sentido das palavras. Claro que sempre busco uma coerência entre ambos. No entanto, se não sinto um gosto adocicado na língua ao pronunciá-las, considero meu trabalho fracassado. Não gosto de poesia seca.

Boa parte de minha inspiração provém de coisas simples: um livro que leio, uma exposição a que assisto. Às vezes, um simples passeio pelas ruas do meu bairro bastam para desatar os nós da minha criatividade. Ainda semana passada, escrevi três poesias que considero boas. Após ter retornado de uma biblioteca comunitária, peguei papel e lápis e deixei as ideias fluírem soltas. Uma das poesias comecei mesmo na rua.

Não é sempre que tenho sucesso. A maior parte do que escrevo ainda considero aquém do que deveria ser. Mas estão melhorando. Lembro que meus primeiros versos eram assombrosos. De vez em quando encontro  um deles por aí, rabiscado numa página solta, e sempre torço o nariz.

Na escola, escrevi um poema que foi premiado. Na verdade, quando soube, por meu amigo Patrício, que tinha ganho o primeiro lugar, fiquei incrédulo, depois espantado. No final, fiquei muito feliz. Foi um estímulo que, se não me impulsionou de imediato, ao menos me fez acreditar um pouco mais em mim.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012



O fim
é o inverso
do começo,
o meio
de ser completo,
a forma
de ser inteiro,
sobra
que permanece
em prece,
gravada em pele,
flor que nunca empalidece,
aroma que não se esquece.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Sempre vou indo
em contra-mão.
A lógica capitalista me engulha.
Às vezes penso que não sou cristão.
Não aceito
não compro
o que está em liquidação.
Não vendo minha liberdade
por nenhuma salvação.
Meu espírito é cubano.
"Salve Che!
Salve a Revolução!"
Meu bem mais precioso
é teu sorriso
teu abraço
que me deixa tranquilo
ultraleve
passarinho.

No paraíso breve
do teu carinho
eu desvaneço
esqueço
e acredito.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Quando acordar
vou estar no mesmo lugar?
Tenho medo de não saber
onde vou parar
Tenho medo de não encontrar
aquela tal luz
aquela tal estrela
aquela tal beleza
após o fim do túnel
Tenho medo de me extraviar
perder para sempre o farol do teu olhar
Quero tua mão para me guiar
teu peito para ser meu fôlego
teu riso para meu sonhar
Quero uma escada
para escalar a lua
ser o primeiro astronauta a constatar:
a Terra é uma bola absurda.
 A paz
é bem mais  que um selo
é bem mais que um elo, bem mais que um sorriso amarelo.

A paz brota
das palmeiras ao vento
do ventre
das rochas
 - e o homem
escravo do medo
cativo das horas
peça de máquina que deu defeito
sequer tomou nota.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Novamente o nada,
névoa que me preenche.

Novamente a mente vaga,
vagabundamente.

Novamente a frase amputada
o lápis imprenhe
meu punho impotente

Novamente
o que não sei me esmaga,
do chão vou colhendo migalhas
alegremente.
Se não sei
para onde estou indo
prefiro ficar
no meio do caminho.

Do meio estou certo
do fim eu duvido.

Prefiro ficar
onde estou vivo
onde posso modificar
o que for definitivo
onde posso tropeçar
quantas vezes for preciso.

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

a vida é pouca
a vida é boba
a vida balança
no embalo da canoa

a vida é pomba que voa
a vida é bomba que estoura
a vida que tomba
já é outra

a vida é rotina
a vida é roldana
a vida às vezes
é carta na manga

a vida é rosa
mas nem sempre um mar
a vida é rasa
quando não sabemos amar
a vida é roda:
o que vai, sempre volta.

domingo, 9 de dezembro de 2012

Poesia se faz
de sons
e palavras,
tijolo e fumaça.

É tinta
que pinta
a vidinha
sem graça.

Poesia
se faz de lágrimas,
mas eu prefiro
quando é piada.
Quero viver
em sol maior
para a felicidade
em mim nunca se pôr.

Quero viver
um tom acima da dor
livre do que não sei
livre para o amor

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Agasalho e abrigo

Amigo,
eu choro por te ver sozinho.
Queria ser teu
agasalho e abrigo
nas horas
em que tudo pouco faz sentido.

Amigo,
toma meu braço,
vem dançar comigo.
O mundo é lindo,
apesar do homem-lixo
e dos conflitos inúteis
em prol de causas tacanhas.
Ainda há flores
sem espinhos.
Não percamos
a esperança.

Amigo,
reza comigo.
Talvez algum dia
tudo volte a ser doce
como a infância.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Amar
é bem mais que dois
é bem mais que amarras
bem mais que feijão com arroz.

Amar
deixa para depois
mas pode também ser agora.
O que importa
é fazer o bem
seja qual for
a hora.
O tempo
é uma piada de mau gosto
que não me faz rir nem um pouco.
Não quero meu corpo
um poste tombado
nem no meu rosto
as rugas de um chato
 - menos ainda tumores
nascendo no meu baço.
Bastam meus temores.

O tempo
é uma piada de mau gosto
e eu não gosto.
Meu coração
deseja
um verso anil
 - desajeitado, que seja -
para conter a pressa
dos dias
um a mil
e não ser presa
do mundo hostil
fútil,
inútil.

Um verso sutil
ou mesmo pueril
para entreter
a tristeza
entremeada
nas horas cinzentas;
que me sustente
quando eu mesmo estiver por um fio.

Para calar
o travo
da dor,
um trevo
de amor.

Um trago,
por favor,
de licor
primaveril.

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Para Olavo Bilac

"Ora (direis) ouvir estrelas!..."

As palavras
da boca da noite caem
como dentes:
são pérolas
de uma poesia comovente,
audível somente
ao coração do poeta.

De prata a lua plena
brilha em sua testa
e, ao seu redor,
os pirilampos fazem festa.

Há beleza em toda a esfera
para quem vê com olhos de pantera
num salto pra dentro da treva: o Poeta.

Coitados dos calangos!

Tudo
morto,
morrido
e matado:

moscas
velando
cadáveres
putrefatos

de calangos
baleados
por meninos
malandros.

Coitados
dos calangos!

Make love, not war


Meu amor
é arma
e bandeira
contra sua metralha.

Meu amor é lança-chamas
que se espalha
sobre palha
de cana,
consome as entranhas
do mundo canalha,
sacana.

Meu amigo,
eu quero amar.
Faz um favor?
Não atrapalha.
Não há teia
que me atenha,
nem grade
que me roube o horizonte.
Há sempre longe
uma fagulha de alvorada
após o que foi ontem,
negro véu de nada.

Não há preço
que me compre
na praça.
Nada tenho
que não deixarei às traças,
senão resmas antigas
de lembranças que não se apagam.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

 

Pensei em vc, Michele Oliveira, quando ouvi essa música.

Noite/Dia

A noite
como golpe de foice
veio e foi-se.

O dia
aos coices
no horizonte
ruborizou-se:

punho sangrento
na Via-Láctea.
Almejo
mais que desejo:
sonho.

Munido
de esperança
o cume
alcanço.

Não me atenho
ao brilho efêmero
do sucesso momentâneo.

Há sempre algo subterrâneo
a ser desencavado
nas galerias de dentro,

Um diamante bruto
a ser tratado. 

Agosto

Acabou-se agosto.
O gosto da despedida
permanece sobre a língua,

lúgubre
como a tarde despida,
em pele-viva.

Embalde
o sino daquela matriz
badalara: fica!
O ponteiro gira,
ultraveloz;
atroz algoz
da vida voraz,
vazia.
Meu peito
almeja
uma centelha
de amahã
sem telhas,

nós e amarras
rompidas,

sonhos manietados
por toda a vida,

maria-fumaça
fumando o futuro

sem nunca perder
o embalo da partida.

Poesia despropósito

fuso
confuso

fora
do eixo

contexto
absurdo

anos-luz
da lucidez
no balaio
da embriaguez


papagaio
mudo

embolia
verbal

desproposital

apatia
no varal

varando
vulto
vespertino

de domingo
sem sal.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Você nunca mais


Você nunca mais vai estar,
a não ser no que não posso tocar.

Eu tento me iludir com meus sonhos
e me sinto ridículo. Você nunca mais
vai estar aqui, para podermos dividí-los.

Não sei lidar com sua ausência.

Nunca vou me acostumar com isso.

Tenho medo de estar sendo chato
quando me repito: sua falta eu sinto
diariamente; dias santos, feriados,
sábados e domingos.

Sei que você não acreditava nisso,
dizia "não ser possível". Mas, acredite,
você foi a mais sublime alvorada
que amanheceu no meu caminho.

Com você
as horas brancas
eram vinho

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Sob a sombra
do assombro
: tetro grito,

teto
do medo,

ossos
de gelo
à iminência
do perigo.
O sol invertido
à hora do sono
conta ao nauta perdido
em maré de enganos
o caminho dourado
do sonho roubado
sob sua fuças afogadas
em salsugem marinha
(ou seria pó de Lua?)
Para Débora, minha profa. de teatro.

Nesse cantinho
de vaso em flor,
dança herbácea;
aos olhos,
cantiga multicor.

Alarido degustativo,
recorte do divino,
regalo de amor.

terça-feira, 6 de novembro de 2012

meia-noite

hora
redonda

buraco vazio
na boca
da sombra

sonâmbulo

enigma
que me toma
em vótice
vertical

ao banal

bobageiras
etc. & tal

Metal físsil

no reflexo
convexo
do metal: o medo

(olhos vítreos
vidrados em mim);

não ser
o mesmo
nem amnhã
estar aqui.

Soneto insular


para minha irmã Bruna, que pensa que sou artista

Vento
copulando
com absurdo
verso

Grito

de areia
que a língua do mar
chicoteia

Inaldíveis decibéis
no dorso de corcéis
alados

Quem decifre
que seja
laureado.

Vendaval

fera
quase besta
quase mula
sem cabeça

fúria
traslúcida
assaltando

varais

não se sabe
de onde vem
ainda menos
que rumo tem

A respeito do tempo





para me pai Aloísio Alves, incentivaor dos meus rabiscos



O tempo
é parco,

mas há espaço
num micro-segundo
para todos os sonhos

absurdos.

Nosso legado:
o futuro.

sábado, 3 de novembro de 2012

Conclusões abstratas

Talvez eu seja
a última ervilha
no seu purê de batatas,

o que restou da festa
e ficou às baratas.

Talvez eu seja
sua única meia furada
entre calcinhas rotas
e camisas remendadas.

Provavelmente seria
a única linha disponível
às duas da madrugada.

Se você fosse minha
eu não pediria mais nada.

Itinerário do sonho

Podei
minhas dores
para colher sorrisos.

Reguei o sol
e ele incinerou
cada ocaso de meus descaminhos.

Valsei,
embalado por ventos alísios,
sobre cúmulos-nimbos,

mais alto que Ícaro
e sua parafernália vagabunda;

mais alto ainda
que os saltos de uma puta
rodando bolsinha
numa esquina suja.

Balões meteorológicos
não me alcançaram ainda,
porque vivo
no mundo da lua.

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Nodoa verde sobre tecido branco

estranha
criatura
verde:

vagem
vaginha
vagina

ao avesso

valsa
submersa
em vomito

ou escarro

seiva
semem
  ou excremento
  de passaro.
linhas
me enchatecem

prefiro me deslinhar:

cada rota
um novo rosto,

miriades
maneiras
de me retraçar.

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Sou o testemunho vivo
das coisas

transfiguradas em mim - cinema
grudadas em  mim - chiclé.

A coisa
despida
sou eu
em pele viva,

corda de violão partida
acordes de agonia

pétala cindida
do cálix do amor.

A espinha
da coisa viva
é a tragédia.

Irrevocavelmente nasci
Irrevocavelmente terei
meu nome numa página de obtuário.

Nação brasileira

pretospardosbrancos
mamelucosmalucoscaucasianos
ciganosmambembesbaianos
patríciosplebeusangolanos
solteiroscasadosamigos
bandidoscalhordaspolíticos
Para vencer
o ócio da rotina:
cafeína
Palavra
perfeita,
pré-moldada:

irregurgitável
caroço,

osso
duro
de
roer

Push to open

abrir
expandir
espairar
eclogir

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Viagem

Para meu primo, Fábio Soares

Sonho
por cima dos ombros.

Nuvens
abaixo dos pés.

Medo
e saudade
superados.

Frente ao novo,
nada a temer.

Passaporte em mãos:
tudo vai dar certo.

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

para minha mãe, Olívia Martins

Teu amor é meu acoito
na tormenta da solidão.

Quando procuro cavernas
teus braços me acercam
e sob minha pele introjetam
a paz que vem do sono.

Quero estar contigo
mesmo quando as palavras,
caducas e bem defuntas,
apodrecerem nos dicionários.

Porque ouço teu coração,
de nada mais preciso.

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Morena

A insolência
dos teus cabelos arredios
é como um mar encapelado
que me joga para cima e para baixo
numa noite
de infinitas pupilas rutilantes.

O olor inebriante
de tua cabeleira
tem as tardes
na boca dum precipício.

Quem dera me fosse dado
o privilégio de sondar
os mistérios que manténs velados
na volúpia de tuas madeixas.

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

O que há em mim
de mais profundo
não atravessa o mundo.

Vivo na beira,
à beira do absurdo.

Costuro rimas
com versos curtos
quase mudos
quase muros
entre razão e sentido.

Porque sou taciturno,
economizo o que digo.
Penso
retalhos

Visto
frangalhos

Mas não sou
espantalho

Dou-me a conhecer
aos pedaços
como um Judas
escangalhado.
Ela sorri
um sorriso de meio-dia:
trinta e duas pérolas raras
de mais pura alegria.

Ela sorri.
Há mais de semanas
seus olhos grudaram em mim
do fundo de uma fotografia.

Mesmo quando choro,
ela sorri.

Canção da caverna

Conto os dias
e espero os ventos
da lembrança antiga
o esquecimento
das paredes frias
o esmagamento
(pó ao pó)
lamento.
O cão tem pressa.
Para onde vai o cão?
Queria saber
aonde vai meu coração

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

No parque

Calor: no céu, no toque, na pele, no abraço. E quase não eram dez da manhã! Ela sentou-se, ofegante, ao meu lado. Não tínhamos andado muito (três ou quatro quarteirões, se não exagero), mas cedeu ao banquinho de praça como se houvéssemos transcorrido léguas. Água; precisava de um gole; sacou da bolsa uma garrafinha transparente; tomou três. Aliviada, sorriu-me. Retribuí com um par de lábios esticados,  meio insosso. Logo me rendi a um mutismo de pedra. Devo ter dado a impressão de que me perdia em profundas conjecturações, porque ela quis saber no que eu pensava. "Em nada", respondi. (por natureza, às vezes me surpreendo com o olhar perdido em algum ponto, daí as pessoas me julgarem num estado reflexivo, quando na realidade minha cacholeta está tão vazia quanto um pedaço de pau apodrecido.) Talvez ela quisesse ter ouvido outra resposta. Poderia ter lhe contado uma anedota ou uma piada boba, só pelo prazer de ouvir seu riso e amenizar sua decepção, mas sou pouco de palavras. Ante a iminência de um novo silêncio, ela novamente abriu a bolsa; revirou-a, resgatando de suas entranhas misteriosas um objeto pontiagudo. Levei algum tempo para reconhecer o presente que me havia prometido na noite anterior. Em retribuição, presenteei-lhe dois livros, dentre os quais meu primeiro, recomendando que o guardasse mesmo que não entendesse meus rabiscos, pois quando enfim a fama houvesse me alcançado, ele valeria uma fortuna num desses sites de leilões da internet. Enfurnei entre as páginas do outro uma carta que ela posteriormente leria. Pude nela revelar-lhe o que verbalmente me ficou impossível. Sabia que ela gostava de cartas longas, por isso tratei de preencher toda uma página. Não mais pedi que não fosse embora. Ela estava decidida, e sua ânsia por conhecer novas feições e paisagens era demasiado voraz. Estava decidida e não arredaria pé. Em vista disso apenas pedi que não olvidasse os velhos amigos. Por um lado eu sabia que minha preocupação era tola. Ela jamais olvidaria. Mesmo que percorresse todos os continentes, mesmo que o tempo esfalfasse os relógios de todas as praças, estaríamos sempre unidos por sentimentos mútuos: afeição e amizade.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012



O melhor de você
transpira em meus pensamentos
quando acordo
e quando me deito.
Você é a volúpia
dos meus sentimentos
em turba desordeira,
a poesia latente
ardente em minhas veias.


Eu abraçaria a morte
para estar com você
porque sozinho
minha sina é padecer.

Eu arrumaria o cabelo
para encontrar você
acordaria mais cedo
anotaria em meu caderno
para não esquecer

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Sentimento transcedental

Você
em mim
é sempre
o céu
pontilhado
de utopias.

Você
em mim
é vida
arterial.
Sinto fome
de alvoradas
quando penso em ti,
amiga.

O que sinto
é transcedental,
não há nada igual
aqui ou noutro mundo

Noite morta

A noite
morta
dura
de pedra
atrás
da moita
não esperava
que o sol
abrisse a janela.

A vida empacou na esquina

A vida
empacou na esquina
quando viu a morte chegando,
frígida, enlaçando
o bem que eu mais queria.

Meu mundo entrou em recesso.

Vivo da esperança
de que volte a rodar a Cirando
ou que tudo vá ao inferno!

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

domingo, 9 de setembro de 2012

A caçadora de vaga-lumes

Para Helenir, amiga, poetisa e filósofa.

Ela ainda não tinha me contado, mas fazia-se urgente que eu soubesse, como se, em tomando conhecimento daquela parte de sua vida, me incluísse entre os matizes que a pigmentaram.

Iniciou com um breve comentário a respeito de como as coisas iam se modificando e nem conta a gente se dava. Tomava como exemplo a rua onde havia crescido: tudo mudado, nada fazendo lembrar a ruazinha onde sequer poste de iluminação e calçamento haviam. Lembrava daquele lugar como o fim do mundo; entretanto, em nenhum outro fora mais feliz.

Era meninota e magrela, na época. A maior parte do tempo passava na rua, distraída com brincadeiras. Dentre tantas, apanhar vaga-lumes era sua dileta. Com um vidrinho de maionese, saía à cata dos insetos no meio do capim alto, até que, exausta, os capturava. Quando julgava que tinha o bastante, corria para dentro de casa e fazia de lanterna os pobres bichinhos aprisionados, cuja luz tíbiamente iluminava os cômodos escurecidos. Na maioria das vezes, entretanto, preferia entocar-se no armário da mãe. Aquelas funduras misteriosas e com um vago cheiro de naftalina sempre a instigaram.

Todas as noites o ritual se repetia. Minha amiga era uma caçadora implacável.

Senti necessidade de também compartilhar algo de minha infância. Participei-lhe o episódio mais obscuro já me ocorrido; na verdade, não o tenho guardado em minha memória - conheço apenas porque minha prima, Laiana, contou-me. Segundo ela, eu a detestava. Certa feita até corri no seu encalço, exasperado, pedaço de pau ou coisa de semelhante valia na mão, esbravejando: "Eu te mato, sua bruxa! Eu te mato!". Foi o que partilhei com minha amiga. Demos boas gargalhadas.

Pirilampo

Queria que você soubesse: acordei no meio da noite pensando que o mundo ruiria; mas sosseguei. Eram apenas as turbinas de um aeroplano roncando distante. Nas entranhas desse monstro descomunal você sorria - imaginei - bebendo constelações num olhar de espanto. No meio da noite você era um pirilampo - e partia.

sábado, 8 de setembro de 2012

Amor à palavra

Será um fenômeno raro me encontrarem com a cara metida num jornal. Foi só por tédio, numa terça-feira em que nada de mais interessante tinha a fazer, que abri um. Evitando os pôsteres publicitários que engoliam páginas inteiras, fui direto ao caderno cultural, onde letras médias encabeçavam um modesto artigo de canto de página: Brasileiro lê Mal e Pouco". O fato não me causou espanto. Estar por dentro dos números foi o que me chocou: "Em média, brasileiros leem quatro livros poa ano, alguns não chegam à metade disso ou abandonam a leitura antes do fim". Perguntei a mim mesmo como tamanha monstruosidade seria possível. Sou um apaixonado por livros, não saberia viver sem eles; magrinhos ou folhudões, amo-os todos. Se os autores são chatos, tento compreendê-los, porque também tenho meus defeitos.

Como seria possível deixar o livro de lado?, foi a questão em mim despertada.Conjecturei inúmeras explicações; risquei, rabisquei cadernos, até encontrar estas linhas.

O problema da leitura, no Brasil, não é histórico, tampouco social, como a princípio julguei. É uma questão de amor. Enquanto o indivíduo não amar a palavra, o livro continuará esquecido, acumulando poeira numa biblioteca vazia ou servindo de banquete a traças no interior  de algum armário sombrio.

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Poesia

Nasce a
meta
no seio do
vácuo,
anseio do barro,
de[lírios] do
Poeta

Abraço

ponte
entre doi corpos
que se temem perder
entre descaminhos,
fundidos em névoa,
densa selva
de sussurros
e suspiros.

Nuvem

Nívea   neve
                      noiva
leve
         luva
                  branca
 nau fantasmagórica,
 baú da infância

             no papel,
             no sonho cosmonauta

      horas à toa
      de barriga virada
      numa boa
      numa boa.

O2

Amo a vida
que o éter presenteia;
vida
mais que tristeza,
mais que chuvisco
num dia insosso
de quarta-feira;
vida Neruda,
vida bandeira,
vívida vida inteira;
pulsante,
pululante
pluriexistencialista.
Nada entendo
de estrelas.
Sou errante
na vastidão láctea
da incertezas.
Deixo para os tolos
a convicção milimetrada,
enquanto viajo na barca
misteriosa da existência.

Sesta

Espadas
de São Jorge
trespassando
pensamentos
baldios,
braços
e pernas
pro ar,
movimento
pendular:
tempo
travestido
em tempo
perdido.
Vespa
bordejando
a intimidade
da flor,
véspera
do amor,
vibrante
desejo
                       audácia
                         e pejo

Quadro-negro

Lágrimas
de giz
na ponta
do nariz
desenhando
solidão.

Peito
gris,
ocaso
infeliz
da
 traição
Meu desejo
é fome
devorando pedras
filosofais,
caravela perdida
em outros ermos
siderais.
Às vezes um nada
em que me deixo vagar
como um vadio vaga-lume.
Às vezes um êxtase
a que o perfume dela me lança:
querer estar junto,
ainda que fisicamente distante.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Viver
é ir confeccionando
o tempo
com partes de si.
Um abraço,
um beijo,
uma frase
dita,
constantemente
repetida,
são fotografias
jamais corrompidas
pelo mofo
ou pela poeira
de gavetas esquecidas.

Rosa

pink
rock
choque
curto-circuito.

cravo
sacada
ringue
nocauteada.
Para ser
não seja;
absorva.

Somos
esponjas
aquáticas.

Outdoor

Espalho
pelas
ruas
cibernéticas
o que
a poucos
interessa
sobre
mim.

Na testa
um outdoor
luminescente,
claro, transparente;
mas ninguém ouve.
Eu grito,
ninguém vê.
Os tributos pagos ao tempo
jamais serão restituidos.
Viver de contemplar
é guilhotina.
Vai, meu anjinho,
entre nuvens de sonho
consolar os corações
desse povo tristonho.

Planta
no peito
o amor
extirpa
a dor
estanca
o pesadelo.

Sussurrante
como brisa
traz a vida
ao solo seco
do homem que
já não crê,
rendeu-se ao desespero.

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Como fere a pele nua,
nossas almas expostas
ao frio, ao relento,
ao castigo extremo
do julgamento estranho!
Quase nunca o que vê
alcança o que há por dentro;
antes mesmo condena
como se o momento
fosse um brinquedo quebrado,
irreversível.

Não somos vítimas do estagnatismo.
Há em todos um universo
em permanente revolução,
pondo abaixo, reconstruindo;
ora fogo,
ora escuridão.

Eu (ao cubo)

paradoxo paralítico
sobre a esfera mundana,
massa de carne
cútis, cocoruto, derme
osso
velho
moço
pouco
para tudo
para tudo
um pouco
                às vezes descontente
                às vezes impertinente
                às vezes penitente
                às vezes um
                vazio que não se apaga
                vontade monstro que não morre
                devorando asas, ventre, sonhos.

Fogo e noite

Não tenho,
nem quero,
a serenidade
que torna os homens
alienados e passivos.

Antes a turbulência,
as contradições de um peito aberto
que o sono de pedra
das pedras dormentes
cansadas de rolar.

Sou fogo
e sou noite.
Sou risco,
constantemente à beira do abismo,
a iminência de um ato insano;
pondo abaixo medos antigos,
solapando antigos enganos

Carta de uma viajante

Não chore nunca, por favor,
se um dia eu não estiver aí.
Meu pensamento contigo estará sempre
quando uma lembrança feliz
um riso teu colorir.

Não chore nunca, por favor,
porque nunca deixarei de pensar em ti.

O amor que nos sustinha, o amor de que me nutrí,
pulsa em cada palmo de mim.
Estou em overdose de liberdade.

Não chore nunca, por favor,
que o momento que nos aparta
tão-somente é madrugada,
prelúdio da alvorada
das coisas que estão por vir.
Peço a livre escolha
de renunciar,
entregar os pontos,
deixar-me ficar,
não ir,
não aderir,
tão somente um espectator,
tão somente um dormir,
uma profunda letargia,
alienado
das coisinhas,
das intrigas,
da azáfama
da rotina;
sem por isso ser anatemado,
condenado em juízo,
traidor.

domingo, 22 de julho de 2012




Volto a novembro

Quando o mundo é pequeno
procuro razões
em outras dimensões
para explicar emoções
que mal nascem
já logo vão morrendo.

Sou levado a pensar:
por que tanto penar
nessa terra de ventos serenos?
Algum dia seremos
maiores que o mar:
amaremos tudo,
esqueceremos nossas dores
como a onda que passa
e assombra o menino
que cisma consigo
na ponte a pescar:

Por que tantas guerras
por que tanta fome
por que o homem
não consegue sonhar
mais alto que o muro
de seu egoísmo
mais forte que o estampido
de suas metralhas?

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Dia, dia
mais um dia
em que nada tenho
a fazer.
Sou plateia
do tempo que passa
diante de minha janela
alheio a mim.
Sou a pedra
onde o musgo repousa
e os mexilhões, cansaddos,
ancoram seus navios.
Sou o vício
de estar vivo.
Carrego em meus pesares
a esperança de que o tempo
arrastará consigo dias melhores

terça-feira, 10 de julho de 2012

Amigos de outrora,
não esqueçam de mim.
Ainda estou aqui,
pouco mudei.
Ando me sentindo
um tanto sozinho,
conversando com meus botões.
Acho que enlouqueci de vez.

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Desde algum tempo não sinto
saudade gratuita de coisas à-toa:
o sol mole da primeiras horas do dia,
o vento geladdo beijando minha epiderme,
contando-me segredos
de uma madrugada sozinha.
Caminhar por caminhar
em algum lugar,
para lugar algum;
apenas sentir o corpo
entrando em aividade,
jogando por terra
sua couraça de ferrugem;
o espírito livre
como penugem vagando
acima da mesquinharia
do homem
sobre o homem,
suas leis de papel,
sua hipocrisia.
Não adianta
lamber os beiços;
hoje só tem
arroz e feijão.
Mas, é preciso crer:
dias melhores virão

terça-feira, 3 de julho de 2012

Sua dor

Quando você trancava
 a porta do seu quarto
talvez chorasse
suas dores de menina.
Eu sempre quisera
ter palavras que calassem
fundo em teu peito
e cicatrizassem teus amores frustrados.
Um abraço também valeria
mas em seu quarto trancada você vivia.
Sua dor a ninguém mais pertencia.

Bonecas e risos

Quem dera eu fosse
o senhor dos ventos;
varreria para longe
a tua dor
e te levaria comigo
no embalo dos coqueiros.
De noite eu seria
brisa fresca
conduzindo-te mansamente
ao reino das utopias.
E quando sozinha você estivesse
e quando a saudade teu peito ferisse,
traria de volta os bons momentos
da tua infância doce
tão cheia de bonecas
e risos.

Chá de sumiço

Quando me sinto desiludido
o vento parece dono de mim;
ora vou para este,
ora para oeste
ou Budapeste.
Tem vezes que nem sei
para quê vim
por que ainda pemaneço
por que não desapareço
como poeira no vento
como chá de sumiço.
Sou apenas coisa
no meio de tantas coisas,
Coisas que se perdem na infinidade de coisas
que não entendo.

Ente noturno

Tua ausência
fez de mim ente noturno.
Esgueirando-me entre becos escuros,
buscando refúgio em saudades,
escrevo lágrimas e dor,
solidão, ansiedade;
Até carta de suicida escrevi.
Pensei burradas,
porém faltou-me coregem.
Tive medo de acordar e me descobrir
ainda mais longe de ti.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Cosmoesfera

Explodem estrelas
na cosmoesfera
quando penso em você.
Uma revolução de sentimentos
me confunde.
Meu querer não me corresponde
então sou levado a cometer desatinos.
Não há remédio
para minha solidão.
Quanto mais penso em teu abraço
mais me dou conta de que estou perdido
no meio do caminho.

E se penso em teu riso
e no calor de teu ser franzino
acalentado pelo mormaço das horas
então choramingo feito menino bobo.

terça-feira, 12 de junho de 2012

Quanto mais te penso
e te desejo
mais impregnado do teu ser
fica o meu peito.

A tua voz
vinda das terras distantes do ontem
desperta em meus sonhos
e me deleito em saudades.

Tenho vontade
de tocar-te novamente
mas você foge
como um pedaço de nunca impossível.

Os derrotados

Se for possível
não me esqueça.
Tome nota do meu amor,
guarde-o em uma gaveta
ou onde o queira.
Se for possível,
me procure depois.
Vou estar aguardando
na mesma esquina, trajando
a mesma camisa
sob o calor do mesmo sol,
como se o tempo
nunca a nós houvesse vencido,
os derrotados.

Tanta gente
em minha vida passou
e eu nem me dei conta.
Rostos que fui esquecendo
frases feitas que foram se apagando
abraços e laços que afrouxaram
com o tempo.

Só você permaneceu
e continua presente
embora fisicamente não esteja.

Não lamento o fato.
A vida aqui é mesmo dureza.
Só espero que esteja feliz, onde esteja,
e aguarde, que chegará minha vez.


domingo, 10 de junho de 2012


Sem teto

Refaço meu passos
e não cconsigo reverter o passado.

Aquele abraço
ficou agarrado
aos paralelepípedos do tempo.

Desde que soltou-se de mim
vago por aí, feito indigente,
sem teto.

Amanhã

Se nosso tempo
não fosse tão agora
viveríamo felizes
no alvorecer.

Amanhã será o derradeiro dia
amanhã nunca vai morrer
Amanhã toda lágrima será alegria
A maldade não rá prevalecer,
nem a fome, nem a desigualdade
que subjugam o homem.
Amanhã todas as correntes irão se romper.

Toda rosa

Toda rosa
desperta e canta
quando a aurora
suas pétalas inflama.

Toda rosa ama
qundo o orvalho a beija.
treme da raiz à ponta
mas não se entrega como besta.

Amigo oculto

Existe um consolo
para cada lágrima,
Um amigo
para cada solidão.
Mesmo que não o perceba
ele está do seu lado,
segurando sua mão

quarta-feira, 6 de junho de 2012

Cão

Eu sou só
carne, material
apodrecível que logo
perecerá. De mim,
nem osso restará,
que osso já sou
na boca desse cão
que é o amor.

Para não te esquecer

Abro a janela.
De repente, não vai chover.

Você está em toda parte,
meu coração vê.

Tem me amparado
quando me sinto cansado
quando penso na distância
que não podemos romper.

Junto forças para avançar
cato palavras para não deixar morrer
momentos que vou resgatando
dentro da noite insone
para não te esquecer.

quinta-feira, 10 de maio de 2012

Poemeto a uma amiga

Você é
toda céu
toda sol
toda manhã, brotando
entre vapores oníricos,
dissipando todo o medo contido
em meu peito / precipício,
prece diária
de meu coração aflito.


segunda-feira, 7 de maio de 2012

Todo

Eu sou todo eu
em cada poro
Sou todo eu
em cada polo
todo eu brotando
em cada solo.
Sou eu dormindo
em teu colo
sonhando o mundo
como um tolo?
Em teus braços
já não me pertenço
e me enrolo todo.

Meu peito de pedra

Meu peito
de pedra
criou estalactites
de madeira
com que fiz minha estaca
e minha cruz.

Em meu peito
de caverna
dormem sonhos
e medos
morcegos
que fogem da luz

Ferrovia

A ausência de um amigo
é a eternidade empacada.
A vida parece enferrujada;
grita,mas não sai do lugar.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Dança mascarada

Máscaras que mentimos
esmagam o que sentimos
como uma grande serpente farpada.

Não quero com ninguém
uma dança mascarada.

Poupe-me

dos amores
de proveta
do riso
de plástico
das palavras
embutidas
dos abutres
da tua vida (pai, mãe,
tia). A monotonia
dos teus gestos
afogou meu saco
no tédio.
Roupas que vestimos
nada dizem do que somos.
Quando dizem, nos tornamos
possuíveis, corrompíveis,
corroíveis,
contorcíveis,
e s t r a n g u l á v e i s.
Não quero mito
menos ainda pesadelo.
Quero subtamente
apagão.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Eu não quero verdades absolutas.Minha luta é contra os impostores que estão vendendo Deus à prestação. Quem são, para monopolizá-lo? Quem são, para saber o que Ele quer de nós? Não necessitamos de intermediadores. Deus existe quando respiramos.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Capim

Por que
teus olhos
me olham
assim,
um pouco
tristonhos?

Às vezes
eu sonho
contigo
assim:
dançando
num campo,
sorrindo
e cantando
entre o
capim.

Paradoxo verde

É verde
o meu paradoxo:
Quero,
mas não posso.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

Um pouco
de choro
para lavar
a alma

Um pouco
de cloro
para alvejar
a vida

Um pouco
de paz
para quietar
o espírito

Um pouco
de pão
para calar
a multidão

Um pouco
de luz
para aclarar
a mente

Um pouco
de verdade
para delatar
o que mente

Um pouco
de mim
dentro
de ti

Um pouco
de nós
no rol
da história. 

13

Talvez
eu esteja
ficando
maluco.
Vejo
vultos
ouço
vozes
de gente
que não
conheço.
Sinto
calafrios
quando passa
um gato
preto.
Credo!

Talvez
eu esteja
ficando
biruta.

On line

Estou
acessível
disponível
plugado
conectado.
Por favor,
não demore
a manter
contato.

É preciso

É preciso
dar sentido
ao que não vejo,
matematizar
o que não pode
ser compreendido.
É preciso
calcular
o risco,
riscar
da existência
o mito,
fingir
que o amor
é aritmético:
um mais um
é igual a dois,
e tudo pode dar certo.

Astros e dados

Os astros haviam previsto: aquele seria um ano bom. Muita coisa mudaria: sorte no amor; no âmbito financeiro, prosperidade.

Não importava alguma coisa saísse fora do que o Cosmo havia determinado, desde que sua viagem não malograsse. Há dias esperava por ela. Pedira contas do emprego duas semanas antes. Ligara para todos antecipadamente. E estava feliz, mesmo sabendo que em um peito amigo deixaria enorme saudade. Que fazer? A vida também era renúncia. E, afinal de contas, não seria definitivo. Prometia voltar para os festejos de fim-de-ano (primeiro a capital, depois o interior). Não estaria abandonado ninguém. Não era uma fuga. Apenas precisava conhecer novos ares e novos mares. Nunca havia andado de avião, e só a expectativa de alçar voo fazia alguma coisa dentro de si flutuar... Talvez os próprios miolos. Não temia ser chamada provinciana. Ela mesma admitia ser um tanto matuta. Tudo lhe era grande, ou profundo demais.

Astros e dados, cartas e búzios, todos haviam errado. Alguém lhe devia ter avisado: vista um casaco, tome seus remédios!

Mas não queria ser motivo de preocupações. Mesmo as peças não estando no lugar, diria sentir-se bem, e, com esperança, aguardaria mais aquela ventania passar.


No escuro. a gente confia ao máximo no que não pode enxergar. Por isso, amo o que não vejo; sinto uma euforia boba em apenas tocar, e descobrir lentamente. Minha boca, meu tato e meu olfato... Cada parte do meu corpo é lume.

sexta-feira, 23 de março de 2012

Palavra morta

A palavra
eu odeio:
escrevo o que quero,
mas não o tenho.

A palavra
não fala
o que vejo:
diz apenas
o que sinto;

minto
no afã inútil
de querer ludibriar a verdade,
a realidade que punge meu peito
e me oprime.

A palavra
hoje
está morta.
Foi sepultada contigo.

terça-feira, 20 de março de 2012

Pedaço de coisa

Sou árvore
morta
bebendo lama
no lodo apodrecido
do pântano contaminado.

Sou árvore
seca
no inverno infértil
de julho.
Meus galhos curvos
apontam para o alto
como mãos trêmulas
a rogarem migalhas
a um deus indiferente.

Sou árvore
decadente.
Por favor,
me cortem
os galhos
e me transformem
num pedaço de lenha.
Só assim poderei ser
pedaço de coisa
útil.

domingo, 18 de março de 2012

Busca

Para Michele Oliveira, in memorian


Você ainda está segurando minha mão?
Eu não sinto.
O teu riso,
agora apenas um eco,
ressoa em meu peito vazio.
A tua voz
recita ao pé do meu ouvido
palavras e frases desconexas
ditas nos momentos felizes
e tristes
de nossa amizade.
Busco tua presença
e pressinto
longos anos de saudade 



Pouco a pouco

Por que, Deus meu
existe essa linha
que separa a morte e a vida
e nos impede
matar saudades
abraçar como nunca antes
a pessoa tão querida?

Eu quero transcender
passar da vida para a morte
sentir tão forte aquele amor
aquela amizade que era vida.

Agora nada me resta,
nada me resta de ti.
Os versos que te dei
não pode-os levar contigo.
Fica, então, com o meu carinho
enquanto eu morro
pouco a pouco
de saudades.


sexta-feira, 16 de março de 2012


Corpo-a-corpo

Para Cidinha,
meu amor louco,
amor de fogo,
insano,
pecado;
amor de verão
e de inverno,
meu inferno
e  meu paraíso.

Quero
tudo.

Quero
teu mundo
teus beijos.
Teu corpo
salpicado de desejos
almejo.

Quero
contigo
um corpo-a-corpo
entre lençóis
e cobertores,
nossos amores
entrelaçados
atados
indivisíveis
indissolúveis.

Não dissimule

Se teu riso
não é verdade,
se teu rumo
não é norte,
se a dor
é de morte
e o amor
não é lume,
por favor
não dissimule.

O gato

No ponto
mais alto
da noite
postou-se
o gato.
Garboso,
as estrelas
fitou
como se
fosse rei
senhor de todas as
noites
e nuvens
e luas
e silêncios
e volúpias
e mortes
e eternidades

Ato insensato

Esquece
esquece tudo
apaga do teu passado
o futuro
hoje presente
rasga
insinera
deleta
toda a memória feliz
da gente que
tão bem te quis.

Cidinha

Cidinha
mesmo inha
tinha um grande
coração.
Não queria morrer
de solidão.

O seu amor
esperava
mesmo de madrugada,
mesmo com o corpo
castigado
a reclamar repouso,
cama e consolo.

quarta-feira, 14 de março de 2012

A madrugada e o poeta

A madrugada,
calada,
talvez reflita...

Em luto antecipado
por si mesma
talvez esteja,

ou aguardando
que o poeta lhe abrace
com doçura

e lhe faça
dois versinhos
meio bestas.

quinta-feira, 8 de março de 2012

Arritmia poética

Perdoa,
minha literatura é pobre,
minhas palavras são parcas,
meus desejos são tantos
e tão diversos: quero e não quero,
amo e não amo.

Perdoa,
minha vida é monotonia,
morre noite, nasce dia,
trancafiado, cerrado,
algemado,
encarcerado.
Carrego pedras no sapato
que retardam meus passos,
tornam meu tempo outro.
Não me encaixo em lugar algum.
Estou sempre fora, num mundo à parte;
meu mundo se parte e se dobra,
rasteja e se esgueira
por entre os caminhos
da solidão
e da utopia.

Perdoa,
o verso é torto,
sofre arritmia;
é velho e caquético,
vai morrer na próxima esquina.

Retrato

Um velho sentado
às margens do rio,
o sol se pondo,
o vento indo,
as palmeiras dançando
um tango silencioso,
o menino pedindo
um trocado ao moço
que vai seguindo
seu caminho
apressado.
O tempo é finito.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Lua

Para minha irmã, Bruna

Lenta
flutua
a lua
cabeçuda,

Lula
gigante
na noite
angustiante
que suspira
pelo dia.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Seu amor

Não perca de vista o seu amor.
Guarde-o, prenda-o
numa masmorra
à sete chaves
em um baú
de marfim
numa torre
de sonhos
guardada
por querubins.

Prenda-o, se preciso for
prenda-o, e não o deixe fugir
de seu coração
seu corpo, seu pensamento,
seus poros, sua cútis
seu amor
não deixe fugir
não deixe cair
não deixe quebrar
não deixe partir.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Abismo

Estou cheio de vazios.
Sou um abismo
dentro de outro abismo
que é a boca do abismo
de um abismo ainda maior
que é meu pensamento
e meu sonho
e meu anseio
e meu devaneio
e meu peito
e meu grito
e meu leito

vazio
tudo vazio
oco
     pouco
vazio
Sou cheio de vazios.

Paradoxo do amor

Amor é coisa que nós, os amantes,
ainda não compreendemos. Por isso sofremos.
Por isso choramos.
             É um paradoxo. Está acima de nós
                   e, ao mesmo tempo, está bem ao nosso lado,
                                 no alcane de um abraço,
                                              um pensamento,
                                                       um sonho.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Nota de indignação

Exmo. senhor,
não quero estar sendo reclamão
mas se assim preferir, pode me chamar
o que não dá pra engolir
é toda essa gente
levando vida decadente
enquanto o senhor, nem aí.
O senhor é uma estátua: não fala,
não vê, não ouve, não fede
não ri nem peida.
Com o perdão da palava,
o senhor não preta pra nada.

Só quero ressaltar, exmo. senhor
que foi esse povo mal educado, mal vestido e reclamão
que pôs o senhor aí, sentado nessa cadeira fofinha
de onde não parece querer sair.

Frente e verso

baleia jubarte juba
juba jubarte baleia
jubarte baleia jubila
baleia jubila jubarte
jubarte jubila jujuba
jujuba jubila baleia.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Café e poesia

Hoje acordei mais cedo
fiz minhas abluções sem pressa, como num filme em pausa,
preparei o meu café, comi o meu café com bolacha
da varanda de casa contemplei o sol que nascia,
bebi a brisa gélida que soprava em minha face
senti que a manhã surgia como dum parto longo e delicado.
Meus pensamentos, como costumeiramente, estavam contigo.
Escrevi poesia.

Apesar dos apesares

Para minha amiga Michele, que viajou para o Rio Grande do Sul e me deixou sozinho em Fortaleza. Meu mundo foi desfalcado!


Nada do que tenho te ofertado
é demasiado pouco para que fique insatisfeita
demasiado grande e pesado para que não possas carregar:
meu amor, que não preenche as linhas deste caderno
meu afeto, que te aquece no inverno do Sul
minha amizade, que te acompanha pela vida afora
me respeito, que sem ele o homem não é nada além das roupas que veste
                                                                      e dos trocados que leva na carteira,
meu pensamento, que sempre está contigo, apesar da distância 
                                      que sempre se interpôs entre nós, apesar dos apesares


Vazio

Sou triste
triste porque busco felicidade
e não a encontro
nessa praça
nesse banco
nesse poço.
Na brisa que sopra não a encontro
nem no tempo que passa
em forma e badaladas da igreja matriz.
Não a encontro em mim,
não a encontro em lugar algum.

Relva

Úmida
florida
verde-viva.

Que vontade me dá
deitar e adormecer
e só acordar quando o mundo for
um lugar bom de se viver
(nunca mais!)

Encontro

Quando nos vimos
havia luz
banco de praça
lago azul,
garças que devoravam peixes
um velho coqueiral
oscilando ao vendaval.
O relógio batia,
meio-dia.
Você estava atrasada,
se desculpava.
mas o tempo
era o que menos importava.

Quando nos vimos,
havia luz,
céu azul,
um bando de rolinhas que debandava
ao som das badaladas
da igreja matriz.
Meninos corriam,
velhos refletiam,
vendedores vendiam.
De tão grande, a felicidade não cabia em mim.


Feliz, eu corri.
Feliz, te abracei,
como se fosse a última
da última vez.
Quando nos veríamos novamente?
Não sei.

Movimento

Vai passar.
A ordem da vida é seguir.
Por mais que queiramos estar perto
estamos distantes.

Vai passar
e o que restará será apenas o silêncio;
não mais dor, não mais angústia,
não mais lágrimas,
inquietação.

Apenas o silêncio.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012


Andarilho

Minha casa é o mundo todo
esse banco de praça, esse poço
onde moças jogam moedas
desejosas de um esposo.

Minha casa não tem teto
moro no universo.
Sou favelado,
tenho casas para todos os lados.

Minha casa também é o coração
daquela que amo tanto, minha vida.
Nele tenho o mundo todo
momento em que desfruto paz
quando repouso a cabeça em seu colo
e adormeço vendo estrelas.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

De carne e osso

Eu não sou virtual
eu sou carne, eu sou osso
eu te toco, e eu te sinto.
Eu rio, e eu choro
se você diz que vai embora
e eu canto, eu danço
na chuva, na rua, no beco
desnudo ou vestido
se você diz que me ama.

Eu não sou virtual
eu sou vivo, ando de bicicleta
vou ao shopping, lavo a louça
e digo boa-noite.

Chovendo estrelas

Contra essa chuva
não há capa
não há teto
não há ponte.
O noticiário das onze não previu,
                                     nem o profeta,
muito menos eu, amor
que fiquei à deriva
a ver barquinhos de papel
e meninos que corriam
por baixo de pontes,
por baixo de postes,
sem medo, sem culpa,
atrás de sonhos que se desfaziam na chuva.
Etavam chovendo estrelas.

Chovendo amores

Correm os namorados
para apanhar seus amores perfeitos
que despencam aos montes, como manga madura
ou coco que desaba da palmeira.
A cidade está em rebuliço,
não se respeitam a regras,
o Brasil se transformou numa Marginal Pinheiros.
Há carros em cima de calçadas,
em cima de gente incauta,
em cima de um cachorrinho que atravessava a rua
alheio a tudo o que se passava.
Choviam amores. Era madrugada.
Em meu quarto, o sono não vinha.
Pensando no amor que não tinha
e que, talvez, despencasse do alto junto com aqueles milhares de amores,
escrevi poesia.

Filosofia do trabalho

O homem trabalha e nada tem de seu
além das roupas e do sapato, que já está furado.
A ele não é dado  o descanso, nem o lazer, apenas o trabalho,
máquina de carne, osso e pensamento
pensamento que devaneia, sonha com amores
futuros promissores
mas logo volta à sua realidade de engrenagens
cordadas e cabos e graxa,
pedra, peneira e suor.
O sonho não alimenta a fome
nem paga o aluguel.

Saudação matinal

Bom-dia, dia
Bom-dia, amor
Bom-dia, Benedita
Bom-dia, pastor
Bom-dia, padeiro
Bom-dia, leiteiro
Bom-dia, castor.

Bom-dia, minha filha.
Bom-dia, meu pai.
Como é que o senhor vai?
Vou bem, vou bem
muito bem bem bem
Quem ali vem?
É o cobrador.
Diga que não estou.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Um estranho no meu sofá

Acordei e ele dormia na minha sala, roncando feito um porco. Tomei um baita susto, mas não me permiti entrar em pânico; me armei com a primeira coisa que tive a meu alcance: um cabo de vassoura. Cutuquei-o de leve. O sujeito não acordou, sequer virou para o outro lado. Cutuquei-o novamente, e dessa vez ele saltou como um artista de circo num trampolim. Perguntei-lhe como viera para ali. ele ainda estava zonzo, respondeu-me coisas confusas; fedia como um gambá - não duvido nada que estivesse bêbado. Nem ele mesmo sabia como fora parar ali. estava tudo borrado na sua cabeça, que doía como se ele tivesse andado num carrossel maluco.

Apiedei-me daquele desmemoriado (tenho um fraco pelos desfavorecidos, meninos de rua e cachorrinhos atropelados, de modo que me basta encontrar algum pelo caminho e meu sentimento humanitário aflora). Embora receoso, ofereci-lhe uma xícara de café: seria bom para a ressaca. depois de tomá-la em três goles, ele me perguntou onde era o banheiro. Disse-lhe que ficava no final do corredor, à esquerda, segunda porta - a primeira era do quartinho de limpeza. Se quisesse, também podia tomar uma ducha. Entreguei-lhe uma toalha, barbeadores novos e sabonete... Ia precisar de muito sabão para se livrar daquele bodum.

Meia hora depois volta ele, um novo homem. Quase não o reconheci, e me armei do cabo de vassoura novamente, achando que todos os malandros do bairro haviam combinado de invadir minha casa.

Sentamo-nos à mesa para o desjejum. Com a cabeça um pouco melhor, o estranho já era capaz de recordar fragmentos da noite anterior.havia tomado um porre - isso era óbvio -  e, se eu não o tivesse ajudado, trazendo-o à minha casa, teria ficado estendido no chão a noite toda, exposto aos atos de vandalismo de moleques de rua, que poderiam ter lhe roubado a carteira ou sabe Deus o que mais.

Não lembro de ter sido um bom samaritano. Para falar a verdade, não lembro nem mesmo ter saído de casa (não sou um homem da noite, preferindo a tranquilidade do meu lar a uma farra). Por um momento, desconfiei da veracidade daquela história, mas logo deixei minha cisma de lado; o sujeito tinha cara boa, parecia ser gente de bem.

Após o café, jogamos baralho. pedi que ficasse até o almoço, mas ele disse que tinha que ir embora, ou a mulher cortaria o seu pinto fora e daria aos cachorros. Não insisti. Despedimo-nos com um caloroso abraço, como se há séculos fôssemos camaradas. Só me dei conta da ausência de alguns objetos na minha sala quando fechei a porta e me voltei para dentro. Quis ainda correr atrás do larápio cretino, mas era tarde: ele havia embarcado num ônibus e dado no pé.